quinta-feira, 14 de junho de 2012

Desafio na China


Eu acabara de chegar de uma viagem magnífica de mergulho em Cozumel (México), quando recebi o convite de uma TV chinesa (Hunan TV) para participar de um desafio num programa deles ao vivo na China.

O desafio era uma competição entre eu e o múltiplas vezes recordista mundial Tom Sietas (Alemanha) para ver quem conseguiria ficar mais tempo sem respirar embaixo da água. Entretanto, eles queriam fazer algo diferente para tornar a competição mais desafiadora. Cada atleta faria sua performance num tanque lado a lado onde a água começaria numa temperatura extremamente fria (5ºC) e se aqueceria até uma temperatura extremamente quente (40ºC). Pelas regras, poderíamos respirar O2 puro antes da performance.

Acredito que o maior desafio para qualquer ser vivo existente é sobreviver: conseguir comida, água, um abrigo para se proteger do frio/calor, se manter longe dos predadores e livre de doenças. Entretanto, para muitos de nós, seres humanos, esses desafios mais essenciais de sobrevivência já foram, de certo modo, superados. Temos comida, casa, cama para dormir, roupas para se adaptar ao clima e remédios para combater doenças.  

Neste cenário onde sobreviver já não é uma tarefa tão desafiadora, acabamos procurando outros desafios e atividades na vida para torná-la algo mais emocionante. Tem gente que se joga de aviões, prédios e montanhas para abrir no ar uma espécie de tecido que amortece a sua queda. Tem gente que vai para o mar com uma prancha e fica o dia inteiro sendo arrastado pelas ondas. Tem gente que se reúne com outras pessoas e ficam correndo atrás de uma bola. Tem gente que vai para debaixo d’água para ficar sem respirar.

Então porque não tornar a vida um pouco mais emocionante ficando sem respirar embaixo da água e, de quebra, conhecendo a China? Pagando bem, que mal que tem?

Assim, logo topei a proposta da TV.

O convite foi feito muito em cima da hora, há apenas 2 semanas do desafio que seria no domingo do dia 03/06/2012. Eles ainda queriam que eu chegasse lá com uma semana de antecedência. Mal dava para acreditar que daria tempo de reunirem tudo o que precisávamos para o evento e a viagem. Mas a China é um país de pessoas determinadas e, por incrível que pareça, conseguiram organizar tudo.

Embora a apneia seja um esporte individual, dependemos muito de outras pessoas, especialmente para a nossa segurança. É essencial que seja alguém qualificado e de confiança. Neste contexto, convidei para ser o meu dupla de segurança o experiente mergulhador e amigo Marcus Werneck. Ele já havia sido o meu técnico quando eu quebrei o recorde mundial de apneia com O2 puro. Poderia me ajudar não só na segurança e manejo dos equipamentos, como também estava disposto a passar qualquer tipo de perrengue comigo durante esta viagem para um país de cultura totalmente diferente da nossa. 

Após intensa negociação com o sr. Yang Tao da Hunan TV sobre tudo o que precisávamos para a viagem, tiramos o visto correndo e no sábado do dia 26/05 já estávamos embarcando para uma longa jornada de mais de 30 h entre aviões e aeroportos até o nosso destino final, a cidade anciã de Changsha, fundada há mais de 2 mil anos.

Fomos muito bem recebidos pela Hunan TV, com direito a flores e presentes logo na chegada ao Aeroporto de Changsha. Ficamos hospedados num hotel 5 estrelas próximo a estação de TV e recebemos o tempo todo tratamento VIP.

Logo no dia seguinte de minha chegada, conheci o meu oponente, o alemão Tom Sietas. Na verdade, o Tom sempre foi o meu ídolo na apneia. Quando eu estava começando, ele já era detentor de todos os recordes mundiais da AIDA nas modalidades de piscina. Foi o primeiro ser humano a quebrar oficialmente a barreira dos 10 min de apneia estática (sem uso de O2). Uma verdadeira lenda de nosso esporte e alguém que eu sempre me inspirei.

Quando eu comecei quebrar recordes e participar de campeonatos mundiais, tive a grande felicidade de conhecer muitos ídolos do meu esporte. Grandes nomes e recordistas que antes eu só havia visto em reportagens e vídeos na TV ou internet. Infelizmente, o Tom, embora um de meus maiores ídolos, não estava nesse grupo, pois ele já havia parado de competir. Deste modo, encontrá-lo na China para participarmos juntos de um programa de TV foi uma satisfação imensa.

Como eu já poderia imaginar, o Tom é uma pessoa muito tranqüila e gente boa. Logo, eu e Werneck fizemos amizade com ele e seu assistente (também muito gente boa), sr. Andrew.

Infelizmente, quase não foi possível fazer turismo durante esta viagem. A nossa rotina consistia em treinar na piscina pela manhã e, durante à tarde e à noite, participar de gravações para a TV.

Em um dos dias que fomos treinar, o Tom promoveu uma tentativa de recorde de apneia com O2 puro para o Guinness e conseguiu o novo recorde mundial com a marca de 22`22``. Participamos como juízes e testemunhas desta incrível façanha e ficamos muito contentes por ele.

Antes de eu viajar, um aluno meu que já havia experimentado algumas viagens para a China disse que eu deveria estar com a mente aberta e preparado para um choque cultural muito grande. De fato, ele tinha toda a razão.

Eles são muito diferentes de nós ocidentais. Não dá para explicar em poucas palavras. Para citar apenas alguns exemplos que me chamaram a atenção em Changsha, destaco:

1-      Comida muiiiito apimentada. Você encontra pimenta fatiada em todos os pratos.
2-      Bebidas quentes. Dificilmente encontramos bebidas geladas. Também é muito difícil conseguir gelo nos restaurantes. Até uma coca cola é servida em temperatura ambiente, sem gelo.
3-      Trânsito de louco. Chega a ser engraçado ver os carros e motos entrando o tempo todo na contramão. Parece ser uma infração tão branda quanto nós pedestres brasileiros atravessando fora da faixa.
4-      Trabalho duro. Os chineses que mantivemos contato pareciam trabalhar umas 14 horas por dia, sem exagero.
5-      Ingenuidade. Levavam ao pé da letra todas as piadinhas sem graça que eu o Werneck fazíamos. Por mais absurdas que fossem as nossas histórias ou afirmações, eles achavam que estávamos falando sério, hehe. 

Pelo menos dois dias da semana foram destinados a uma bateria de exames médicos no hospital. Eles queriam investigar se nós tínhamos alguma característica física ou fisiológica que nos tornaria mais aptos a fazer apneia por longos períodos. Infelizmente, não recebemos os resultados de todos os exames. De modo geral, apenas parâmetros como capacidade pulmonar e oxigenação do sangue registraram valores acima da normalidade. Os resultados entre eu que meço 1,91 m e o Tom (1,93 m) foram muito similares.   

Nossa comunicação era toda em inglês, sendo sempre intermediada por tradutores, já que poucos chineses falavam inglês. Por necessidade, me senti obrigado a aprender pelo menos meia dúzia de frases e expressões em mandarim. Ficava todo bobo quando conseguia falar com um estranho.

Para mim, o desafio ia muito além de fazer apneia num tanque de água fria que iria se esquentando. Fazíamos parte do show. Então, era a nossa obrigação ajudar a organizar aquilo tudo. Trabalhamos duro para que tudo desse certo.

Eu ficava imaginando como seria se as coisas dessem errado. O quanto de energia e dinheiro que haviam sido gastos naquilo. Senti um peso de responsabilidade enorme nas minhas costas. No dia do show, tínhamos um tempo exato para dar entrevistas, respirar o O2 e partir para a performance. Qualquer mínimo vacilo poderia comprometer todo o evento.

No fundo, eu gosto de sentir essa adrenalina. Para mim, o verdadeiro desafio é aquele onde existe real possibilidade de falha. Não considero um desafio quando você já sabe que tudo vai dar certo.

O programa Mango Broadcast da Hunan TV foi assistido por mais de 10 milhões de pessoas, atingindo a quarta maior audiência na China naquele momento. Cabe ressaltar que a China possui mais de 100 canais de TV. O resultado pode ser conferirido no vídeo abaixo.

Agradeço a todos que fizeram parte desta espetacular experiência direta ou indiretamente, especialmente o sr. Yang Tao, Marcus Werneck, senhoritas Cindy e Grace, Tom e Andrew, toda a produção do programa, meu irmão Rodrigo e a Fun Dive.

Vídeo do evento: http://www.youtube.com/watch?v=YsBiYyR9Js0






Viagem a Cozumel - México


Considero-me um felizardo por já ter conhecido tantos lugares especiais e poder estar sempre viajando. Na verdade, a maioria das viagens que fiz sempre tiveram um objetivo relacionado ao meu trabalho de biólogo ou de atleta. Esta foi a primeira vez que viajei com o objetivo puro e simples de passear e fazer turismo.

Foi simplesmente espetacular! A companhia dos grandes amigos Irvin, Veruska, Murilo e Therson tornaram a viagem muito especial e divertida.

Seguem algumas fotos da aventura.